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Operação Faroeste: Em áudio, Geciane Maturino teria confessado lavagem de dinheiro

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Foto: Arquivo Pessoal

Em um áudio obtido pelo Bahia Notícias, a esposa do “quase-cônsul”, Geciane Maturino, teria confessado que lavou dinheiro proveniente do esquema de compra e venda de sentenças envolvendo uma disputa de terras no oeste baiano. Segundo a subprocuradora da República, Lindôra Araújo, Geciane e Adailton Maturino, investigados na Operação Faroeste, podem estar “enganando” os próprios advogados sobre a acusação de lavagem de dinheiro.

O alerta foi feito pela subprocuradora ao ministro Og Fernandes, relator do caso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), no pedido de manutenção da prisão dos investigados. Lindôra frisa que os patronos do casal “vêm sustentando, com fervor, a inocorrência do crime de lavagem de dinheiro”, diante da origem ilícita dos valores provenientes de acordo firmado em uma ação de reintegração de posse de terras do oeste baiano. 

Segundo o MPF, no áudio gravado no dia 21 de maio de 2019, por volta das 12h, o contador Edson Cella avisa a Geciane Maturino que já conversou com Adailton sobre os procedimentos para lavar o dinheiro e aponta o envolvimento do filho do borracheiro José Valter Dias, Joílson Dias. “Viraram e mexeram e disse que não vai fazer dessa forma, só através dessa situação do Joílson. Eu tentei contra-argumentar pra ele não envolver Joílson nessa situação porque vocês não tinham a terra em 2013, o Tribunal de Justiça da Bahia só liberou isso ou expediu o acórdão em 2016. Então, como é que poderia vender algo que não tinha ainda? Mas ele disse que não aceita de outra maneira. Essas autorizações, inclusive, era pra ter enviado pra mim antes de enviar pra ti, senão vira um balaio de gato. Paciência, enfim, agora, pra justificar esses R$ 250 mil mais R$ 250 mil, vai ter que envolver Joílson também. Não sei, vou pensar a partir de 14 horas como fazer esse procedimento.” 

Geciane lhe respondeu: “Pois é, e fica uma coisa meia assim né? Como é que eu tô vendendo uma coisa que eu ainda não tinha? Então tá, aparenta que eu já sabia que ia ganhar. É, então, é, eu vou mandar até seu áudio aqui pra pra Joílson, pra esperar, né? Esperar você conversar com ele, viu? Você conversar com ele pra ele não assinar nada assim, porque tá meio que estranho mesmo”. Fontes consultadas pelo Bahia Notícias sinalizam que o áudio pode ser considerado uma confissão da lavagem de dinheiro por parte do casal Maturino. Ouça o áudio:

A Polícia Federal extraiu diálogos entre Geciane Maturino e contadores no aparelho celular apreendido no dia da deflagração da 1º Fase da Operação Faroeste, realizada no dia 19 de novembro de 2019. As conversas sinalizam um esquema de fraudes em contratos de empréstimos para dar aparente legalidade à movimentação de R$ 14 milhões. A subprocuradora destaca a preocupação dos contadores com os valores envolvidos, pois foram movimentados antes mesmo de qualquer decisão judicial favorecendo o casal Maturino. A fraude visaria fugir da fiscalização da Receita Federal.

O casal, segundo a investigação, utilizou diversos subterfúgios a fim de se dar legalidade às origens de recursos nas contas de Geciane Maturino, dando embasamento inverídico a questionamentos da Receita Federal. Geciane havia sido intimada pelo Fisco para explicar a movimentação financeira atípica. O problema teria surgido a partir de um débito do Simples Nacional de 2016 e alguns meses de 2017, no valor de R$ 35 mil. O contador Edson Cella diz que para “dar cobertura à origem desses valores”, considerou a movimentação como honorários advocatícios, e conta que, como a empresa está no Simples, “o custo é muito barato para esquentar esse dinheiro e a gente não ter problema com o Fisco Federal aí na frente”.

Em outra mensagem, de 20 de novembro de 2018, o contador pediu a Geciane para enviar todas as contas pessoa física para identificar as transferências da holding JJF e para a pessoa jurídica dela para “dar lastro” como empréstimos ou como honorários advocatícios. Edson diz que iria elaborar um contrato mútuo com data retroativa para apresentar para a Receita Federal. “O que não pode é o salão ter emprestado dinheiro sem ele ter faturamento, mas provavelmente você tá usando um contador aí pra declarar um faturamento do salão né”, alerta o contador. Geciane era sócia de um salão de beleza em Villas do Atlântico.

No dia 8 de fevereiro de 2019, Edson alertou Geciane que a Receita Federal estava em cima, “observando” as movimentações bancárias do casal. “Não adianta sair dinheiro de um lado e cair na outra conta e não ter uma origem, então a gente tem que tomar esses cuidados, entendeu Geciane?”. No dia 18 de fevereiro de 2019, ela conversa com o contador e diz que não precisa reconhecer firma dos contratos de mútuo, por conta da data ser retroativa, para o Fisco não desconfiar que ela fez o contrato naquele momento. Já no dia 20 do mesmo mês, Edson afirma que entrou na conta corrente de Geciane um depósito de R$ 500 mil e que o valor não foi declarado.

“O Fisco provavelmente vai pegar, vai te cobrar imposto em cima disso, omissão de rendimentos caso Edgar [outro contador] não tenha declarado lá que emprestou dinheiro pra você”, afirma o contador. Edson Cella também diz que tem outro valor de R$ 250 mil do grupo Franciosi e que não consta na declaração dela. “Provavelmente o fisco vai autuar em cima disso, então, nem tudo vai ser perfeito, eles vão achar divergências e diferenças em 2015 e 2016 e vão te autuar, infelizmente”, informou o contador. A sugestão dele era declarar o valor como empréstimo para tentar livrar Geciane da fiscalização dos R$ 500 mil.

Outra conversa obtida pela Polícia Federal nos dois aparelhos celulares de Geciane sinalizam que o contador fez 41 contratos fraudulentos para ludibriar o Fisco. No dia 9 de março de 2019, Edson encaminhou uma mensagem para um contato não identificado, falando que sabia que, mais cedo ou mais tarde, a Receita ia intimar o escritório de advocacia de Geciane, detalhando os repasses:  “Os repasses são os seguintes, olha só: o dinheiro sai da JJF e vai para o escritório de advocacia dela. Uma parte eu contabilizei como faturamento Simples Nacional e uma parte como empréstimos da JJF. Bom, aí tu pega os extratos bancários da empresa Geciane 2017 e tem saídas, muitas saídas, pá, pá, pá, pá, saídas, muitas saídas, mais ou menos uns R$ 14 milhões, se não me falha a memória, sim, eu coloquei como empréstimos pra ela na declaração de Imposto de Renda”. Ele continua: “Eu tenho receio do Fisco circularizar quem ela repassou os valores, e o Fisco, ao fazer isso, se eu disser que eu emprestei pra ela e verificar que não foi empréstimo pra ela, foi um repasse de dinheiro para terceiros a qualquer título, poderá entender que esse documento de empréstimo pra ela, é… pode ser uma fraude, uma fraude documental”, avalia. 

Na mesma conversa, Edson Cella afirma que em 2015 e 2016, a holding JJF ainda não existia e não se tinha o acórdão do TJ-BA que concedia a posse das terras para os Maturinos. “Antes disso, Adailton, é o que eu entendi do histórico tá, foi tomando dinheiro emprestado com Di Domenico, tomando dinheiro emprestado com beltrano, com cicrano, pra poder alavancar os negócios, pra poder sustentar, não adianta imaginar que vocês vão chegar na frente do Fisco, porque não é esse o papel do Fisco, e ele vai perguntar, ah, porque que você tomou esse dinheiro emprestado, ah, tomei esse dinheiro emprestado pra fazer isso, isso e isso, não é assim que funciona, isso tem que estar declarado no Imposto de Renda de quem tomou o dinheiro emprestado e de quem emprestou, ou na contabilidade da empresa. Enfim, isso aí não foi declarado, ora, o que nós não podemos nesse momento é deixar, ou permitir, ou concordar, permitir tem que permitir que o Fisco autue, considerando esses valores como rendimentos da tua atividade enquanto advogada, porque se ele fizer dessa forma, Geciane, vai virar 27,5 % de imposto, mais 75% de multa de ofício, entendeu? Então, vai ficar muito pesado, é isso que estamos tentando agora administrar, tá bem”, alertou o contador à ré da Faroeste.

Em outros trechos de conversa, Edson afirmou a Geciane que apresentou contratos de mútuo de R$ 3,8 milhões, e que o saldo na declaração do Imposto de Renda é de R$ 3, 2 milhões, com uma diferença de R$ 541 mil, como devoluções que fez para JJF. “Eu só tô apresentando para o auditor o que ele tá pedindo, que são os contratos de Mútuo, então, deixa dessa forma, não vamos mexer em nada, do jeito que eu te mandei, nós vamos apresentar”, informou.

A PF concluiu que Geciane sabia e participava de todas as fraudes e que Adailton tinha conhecimento de detalhes das movimentações financeiras da esposa. O esquema também contava com a participação dos filhos do casal, Adrielle Brendha Macedo Maturino e Adriel Brendown Torres Maturino. No dia 14 de maio, Edson Cella diz para Geciane que iria conseguir comprovar para o Fisco a origem de R$ 2,7 milhões como empréstimo, e que isso mataria “todas as operações”. “Os demais valores 2015 foram transações que você transferiu de uma conta sua do Itaú para o Banco do Brasil e vice-versa por exemplo, e o resto é miudeza, deixa que ele autue, é miudeza mesmo, entendeu Geciane”, orientou. No dia 28 do mesmo mês, o contador fala para Geciane que eles precisam fazer tudo com “um certo grau de dificuldade, e, sem qualidade nesses papéis, pra não caracterizar ao Fisco de que a gente tá fraudando, que tá construindo, fabricando documentos agora”. Ele conta que mandou coletar a assinatura de Joílson Dias e que fez os documentos com fontes diferentes, espaçamentos diferentes, “justamente pra não achar que foi fabricado tudo agora, porque se você tivesse todos esses documentos, você já teria apresentado, porque que estamos protelando tanto, não faz sentido, estamos protelando porque tivemos que bater aos remetentes, por isso, esse tipo de manifestação o Renato tem que ter olho no olho com o auditor.” 

No dia 28 de maio de 2019, Geciane responde que ouviu os áudios de Edson, e que os documentos estão ilegíveis, mas que, qualquer coisa, pediria para Adailton pedir para alguém pegar os contratos e escanear para ela assinar. Entretanto, ela diz que, “mesmo que eu tente fazer o mínimo de esforço no braço, na mão né, pra pra assinar, vai aparentar que eu assinei uma coisa, tipo que, sei lá, não sei, mas é montado”. Ela também diz que queria testemunhas para assinar os contratos. No dia 10 de junho de 2019, Edson diz que já elaborou o contrato de mútuo: “bem simples, mudei a estrutura, pra não dar conotação que todos foram fabricados agora”.

Em junho, em outra conversa, Geciane afirma que estava com a filha, ajustando os extratos da GM Advocacia e que ele mandou uma tabela com valores de R$ 6 milhões e que elas só conseguiram visualizar R$ 6 mil. “Eu não tô conseguindo achar R$ 6 milhões”. Segundo Edson, esses saíram da conta de Walter Horita, da operação da Fazenda Estrondo, e que estava tratando com Adailton como registraria essa operação. “Esses valores aí tu não precisa te preocupar em fazer nada tá, pode deixar que eu tô tratando com o Adailton, o contador deles aí, pra ver como é que nós vamos registrar isso retroativamente, os valores da JJF também, tu não precisa se preocupar porque vamos ter que dar uma conotação de empréstimos”, tranquiliza o contador. Ele fala que o importante é verificar os outros valores que ele não sabe de onde são. E diz que Adailton, a todo mundo, diz que são dos negócios. “Mas eu não conheço, eu não consigo identificar quem são. Eu olho no extrato aí e não sei, e se realmente se referem a operações daqui ou não. Enfim, e, e uma parte disso a gente vai ter que registrar como rendimentos do escritório, tal qual a gente fez em 2017, porque, alguma coisa de imposto tem que pagar, né? Geciane, não pode passar R$ 27 milhões na conta da tua empresa e nada ser de rendimento do, da atividade do escritório, tá bem?”, avisa.

No dia em que foi presa, em Brasília, Geciane afirmou que usufrui de valores em sua conta corrente repassados pela empresa JJF Holding na forma de empréstimos. A PF concluiu que a informação vai de encontro aos procedimentos apresentados, tanto dos contadores, quanto de Geciane e de terceiros envolvidos. No dia 13 de novembro de 2019, cinco dias antes da deflagração da Operação Faroeste, Adailton havia encaminhado uma mensagem para Geciane negociando a compra de diamantes (veja aqui).

A PF também encontrou mensagens de Geciane com a filha Brendha criticando a conselheira Maria Tereza Uille Gomes, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por ter bloqueado as matrículas das terras do oeste baiano. “Minha amiga, vai sair uma decisão, aquela mulher, aquele demônio, que tá lá em Washington, a Maria Teresa é, bloqueando tudo nosso, aquele demônio, está lá em Washington atentando aqui no Brasil, você acredita? Seu pai tá no desespero só”, escreveu. “Bloque, eu não sei Brendha como é que vem né, mas tipo, o que ela já fez né, que tipo mandou tudo pra Polícia Federal, não sei o quê, um monte de coisa, e agora a desembargadora do TJ-BA, é, a desembargadora Ilona deu uma decisão pra cumprir né? A decisão dela liminar, que ela tinha dado pra voltar tudo de novo 1037, agora ela vai dar uma decisão contrária a decisão da doutora, da desembargadora daí entendeu? Ou seja, ela não poderia entrar no âmbito jurisdicional, porque o CNJ é administrativo, entendeu? Ela já tá entrando na seara jurisdicional, tá, tá extrapolando, essa mulher tá com o demônio no corpo, entendeu?” A filha responde que a conselheira é “o cão em forma de gente”.

Adailton e Geciane Maturino estão presos desde o dia 19 de novembro de 2019. Nesta semana, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu o julgamento de diversos recursos e manteve a prisão dos réus denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) por corrupção ativa e lavagem de dinheiro.


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